As nossas vidas são uma soma de decisões, algumas boas, outras nem por isso. Mas todas elas devem merecer da nossa parte uma reflexão, devendo constituir uma aprendizagem contínua como se o tempo nos permitisse indefinidamente corrigir o que foi mal feito e repetir as boas opções.
Esta aprendizagem é fundamental para tentarmos entender o mundo em que vivemos, a sociedade onde estamos inseridos e da qual somos também “construtores” ativos.
No meu caso pessoal e sem qualquer pretensão de achar que estou a “descobrir a pólvora”, as minhas reflexões construíram um modelo de sociedade muito simples estratificado em três níveis entre os quais todos nós nos movemos.
Ética (nível 3) |
Legal (nível 2) |
Ilegal (nível 1) |
Figura 1 – A sociedade e os seus níveis segundo Luís Simas
Se cada uma das nossas atitudes ou decisões pudesse ser representada por um ponto e os critérios para colocar cada ponto no respetivo nível estivessem muito bem definidos, o que distinguiria cada elemento da sociedade era a posição da mancha formada pelos diversos pontos.
Uma mancha mais concentrada no nível 1 representaria aqueles que vivem à margem da lei, outra mais presente no nível 2 representaria todos aqueles que manifestam um comportamento em conformidade com as regras estabelecidas, enquanto que uma mancha predominantemente no nível 3 seria representativa de todos aqueles que pautam as suas atitudes e decisões segundo critérios de ética.
O que devemos fazer nos diversos momentos da vida é analisar onde está a nossa mancha e se a queremos deslocalizar para outro nível e este procedimento é a nossa reflexão sobre o caminho que seguimos no passado e que queremos passar a seguir no futuro.
Idealmente, o que devemos procurar todos é “ascender” ao nível 3, ou seja, gerirmos todas as nossas decisões por critérios éticos. Ora, esta “ascensão” é certamente uma utopia, mas que todos deveríamos perseguir.
Mas a simples referência a critérios éticos fazem-nos associá-los a questões fraturantes e complexas como a eutanásia, a interrupção voluntária da gravidez ou a utilização de barrigas de aluguer, por exemplo.
No entanto, existem questões bem mais simples e que podemos facilmente analisar com base na estrutura representada na figura 1. Assim, pensemos no cumprimento dos limites de velocidade estipulados pelo código da estrada e na seguinte questão:
Por que razão cumprimos os limites de velocidade?
A resposta correspondente ao nível 1 é muito simplesmente “não cumprimos”.
Se a nossa decisão corresponder ao nível 2 significa que a razão associada ao cumprimento dos limites de velocidade é não querer incorrer numa infração para não ser multado.
Contudo, se a nossa decisão for norteada por critérios éticos, ou seja, nível 3, é porque consideramos que o cumprimento dos limites de velocidade é mais seguro para nós e para os outros.
De facto, este exemplo numa questão não fraturante evidencia que uma decisão de nível 3 tem como consequência o cumprimento dos critérios constantes do nível 2, ou seja, cumprimento da lei, e um afastamento claro do nível 1, ou seja, da ilegalidade.
Este exemplo constitui também uma boa forma de demonstrar que o cumprimento da lei deve ser uma consequência das nossas decisões baseadas em critérios éticos e não o contrário.
Um olhar mais atento às notícias com que somos “bombardeados” todos os dias levam-nos a identificar inúmeros exemplos de comportamentos que quase unanimemente são errados, mas que são contrapostos pelos alegados infratores pelo estrito cumprimento da lei.
Ora, a mensagem que gostaria de deixar é que quando alguém invoca incessantemente o cumprimento da lei para justificar algum comportamento ou decisão, certamente algum critério ético está “ferido de morte”.