Nas últimas horas tem sido feito um eco extraordinário de uma das frases da entrevista da Professora Susana Peralta ao Jornal I e que diz “Podia-se lançar um imposto extraordinário a quem não perdeu rendimentos”.
Ora, esta sugestão é feita no contexto de uma crise económica e social que foi agravada pela pandemia que vivemos há cerca de um ano. Contudo, por razões que eu compreendo, a polémica instalou-se e também eu discordo em absoluto de uma medida deste género.
Na sequência da polémica instalada, já li declarações da Professora Susana Peralta dando nota que os críticos à sua sugestão devem ler a entrevista na íntegra e não se deixarem envolver naquilo a que hoje se chama “soundbites”. Eu li e confirmo que a entrevista é muito mais do que esta sugestão e tem um conjunto de reflexões importantes que não devem ser ignoradas.
No entanto, não sendo eu um professor universitário, nem um eminente economista, mas tão só um cidadão comum que procura ouvir tudo e todos e depois pensar por si, parece-me que mais uma vez vamos no caminho errado.
A sensação que tenho é que Portugal está constantemente naquela perspetiva de “agora é que é”, ou seja, esquecemos os erros do passado e começamos do zero. O problema é que esta “metodologia” repete-se de forma constante.
Somos um país de futuro constantemente adiado, somos um país de constantes tentativas falhadas.
Há cerca de 110 anos foi assassinado um chefe de estado, Rei D. Carlos, e subsequentemente implantada a república sob o argumento de que a monarquia tinha falhado, o país estava irremediavelmente atrasado face aos seus pares e era preciso um rutura do sistema. Sou um forte contestatário da implantação da república alicerçada num crime e não na vontade do povo, mas também muito grave é o facto desta I República não ter sido capaz de cumprir o que prometeu, ou seja, desenvolver Portugal. De facto, o resultado foi um país sem liberdade de imprensa, com mais assassinatos de chefes de estado (Sidónio Pais) e com o agravamento da pobreza extrema de Portugal acumulado com uma participação desastrosa na I Guerra Mundial, apesar da valentia dos soldados portugueses. Esta foi a primeira tentativa falhada.
As condições do país proporcionaram a instauração do que foi designado por Estado-Novo, que contribuiu para colocar Portugal num atraso ainda maior face aos seus parceiros europeus e para um empobrecimento insustentável da população portuguesa. Neste período vivemos isolados do mundo e do desenvolvimento e, mais uma vez, esta tentativa não resolveu os problemas do país. Esta foi a segunda tentativa falhada.
Seguiu-se uma revolução (25 de abril) com o propósito de retirar Portugal da ignorância, do subdesenvolvimento e da pobreza extrema, instaurando um regime democrático e prometendo um futuro promissor. Passaram mais de 45 anos e já fomos assistidos três vezes por organizações internacionais por não sabermos como nos governar, por não sabermos gerir os nossos recursos financeiros. Mais uma tentativa falhada.
Passaram mais de 110 anos desde a primeira vez que nos prometeram que seríamos melhores, que viveríamos melhor, que deixaríamos a cauda da Europa, mas a verdade é que todos falharam!
E este falhanço é coletivo, porque nós, os cidadãos comuns, continuamos a dizer mal dos nossos governantes, das nossas elites, mas não mudamos nada. Continuamos a deixá-los gerir os impostos que nos levam e que não têm servido de forma eficaz e eficiente para nos retirar da cauda da Europa. Antes pelo contrário, somos ultrapassados e o número de países que vemos à nossa frente não para de aumentar.
A pandemia que vivemos parece a raiz de todos os males, mas não tenhamos memória curta! Esta situação pandémica apenas veio mostrar ainda mais todas as nossas fragilidades: um tecido económico incapaz de resistir a uma crise sem ajudas, um sistema de ensino com infraestruturas degradadas, professores e funcionários desmotivados e em constantes reformas do sistema educativo que não trazem estabilidade na formação das gerações vindouras, ficando também elas incapazes de dar um contributo relevante para a melhoria do país, um sistema de saúde que não tem os recursos humanos, técnicos e financeiros necessários e que não é capaz, em situação normal, de viver sem listas de esperas, sem filas de pessoas para marcar uma consulta, um sistema bancário que falha, um sistema judicial que é moroso e gera injustiças e por aí em diante…
Não, não quero contribuir com mais impostos para resolver um problema social e económico que não foi criado pela pandemia, mas sim amplificado. A resolução destes problemas é papel do Estado, é o Estado que tem que ser capaz de resolver estes problemas com os impostos que já pagamos. E se a bazuca financeira, recentemente designada por vitamina, não pode ser utilizada na resolução das fragilidades que já existiam antes da pandemia e que ao longo do último século o país não foi capaz de resolver, então está na hora de começarmos mais uma vez do zero, mas desta vez sem oportunidade para falhar. Desta vez, não podemos ter mais uma tentativa falhada.
É importante que tenhamos a noção que não se pinta e se compram móveis novos para uma casa que está a cair. Primeiro, reconstrói-se a casa e o nosso país precisa de ser reconstruído antes de ser embelezado com “transições digitais”.
De uma vez por todas, olhemos para os problemas resolvendo as suas causas e não minimizando as suas consequências.
É por tudo isto que eu não quero um imposto extraordinário aos meus rendimentos para resolver um problema circunstancial quando ele é, de facto, um problema estrutural.
Muito Bem Luís !
Gostei !
Também não concordo com mais um imposto que nem temos a certeza onde vai parar.
Se o estado serve para resolver uns problemas , também serve para resolver estes . Não será só para gerir a Bazuca , Vitamina , ou mais o que lhe aprouverem chamar .
GostarGostar
Sobre estes 110 anos, nem a implementação da República, nem a imposição do Estado Novo, nem tão pouco a revolução do 25 de Abril foram feitas por vontade popular, mas, como disse o grande poeta a propósito de uma bebida Norte-Americana, “primeiro estranha-se, depois entranha-se”, e aqui estamos nós, povo de brandos costumes, cada vez mais na mesma… Impostos em função do diferencial impacto de uma desgraça? Díficil de aceitar, mas enfim, tudo se pode esperar de uma elite política que pouco governa mas muito se governa. Continuemos!
GostarGostar